O PRÍNCIPE E O SINO
História e desenho de JCCanoa (15 anos)
Tudo se passou há muito, muito tempo no jardim de
um palácio real.
As flores pareciam bailar suavemente, mostrando as
suas garridas cores. Os pássaros cantarolavam alegremente nas altas e verdosas
árvores. E tudo era acompanhado de uma harmonia e odor maravilhoso que nos
inspira e dá asas de liberdade.
Por entre todas estas maravilhas naturais,
deslizava um pequeno príncipe vestido com bonitas vestes e com os cabelos em
anéis quase tão brilhantes como a bola que segurava nas mãos.
Não penses que era uma bola normal, igual à tua e
a tantas outras que existem. Não. Era uma bola de oiro. É claro que não
saltava, mas o principezinho não se importava com isso.
Todos os dias brincava com ela, segurando-a bem
firme e zut!... Lá ia a bola pelo ar, caindo num sítio onde não fazia estragos.
Corria então a apanhá-la e tornava a lançá-la para tornar a fazer o mesmo.
Foi assim que um dia se encontrou numa zona mais
afastada do jardim do palácio, onde tudo crescia em mais liberdade e sem
cuidados. A relva estava muito alta e as flores misturadas com as ervas; mas
não era por causa disso que eram mais feias, antes pelo contrário: eram viçosas
e desabrochavam com uma rara beleza e cor.
O príncipe ficou encantado ao verse num novo
mundo desconhecido e ia embrenhar-se por ali a dentro, quando soou o gongo para
o jantar.
Sacudiu o fato e correu para o palácio, prometendo
a si próprio que ali voltaria no dia seguinte. Sabia-se lá o que poderia
encontrar!...
Assim o pensou e assim o fez. Logo que pôde vir
brincar para o jardim, observou onde estavam os jardineiros, fingindo brincar
normalmente com a sua bola e, na primeira oportunidade, esgueirou-se.
— Já posso brincar
Sem me incomodar
Sem ser ouvido
Ou repreendido.
Cantou ele alegremente. Como ali tudo era tão
livre, tão natural, tão belo! E o principezinho olhava tudo em redor.
— Oh! – exclamou ele surpreendido. – Sempre pensei
que esta torre estivesse fora das muralhas do palácio.
Era verdade. A torre que o principezinho encontrou
era muito alta, mas as árvores do jardim também o eram, permitindo apenas que o
andar superior da torre se avistasse das janelas do palácio e, como as árvores
também eram muitas, encobriam as muralhas.
— Viva! – gritou o príncipe radiante. – Nunca ninguém
me disse nada sobre esta torre e... oh que bom! Tem um sino! Vou tocá-lo!
Entrou para dentro da torre que não tinha porta e
subiu os degraus dois a dois; mas que desilusão!...
— Não tem corda! Assim não posso tocá-lo! – disse desiludido.
Olhou em volta a ver se via vestígios de alguma
corda, mas nada... e ficou tão dececionado que, sem pensar, perguntou ao sino:
— Então, Senhor Sino, que é feito da sua corda?
Mas, supresa das surpresas, o sino respondeu:
— Ora, que corda? Nunca usei nem preciso de uma
corda.
— Mas o Senhor fala! – exclamou o príncipe muito
admirado e descobrindo que o sino tinha olhos e nariz, além da boca.
— Pois claro que sim! - retorquiu-lhe o sino. – Só
que nunca ninguém me havia perguntado nada a não seres tu agora.
— E como é isso de não precisar de corda? Todos os
sinos, como o Senhor, precisam que lhe puxem uma corda senão não tocam.
— Pois eu não. Sou especial!
— Especial?... – proferiu o principezinho em tom
de dúvida, pois não compreendia.
— É claro! Sou mágico! Um sino mágico!
— Não sei se acredito. Não! Não! Não acredito a
não ser que... toque um pouco para eu ouvir.
O sino ficou triste e, soltando três grandes e
brilhantes lágrimas, que só os sinos são capazes de chorar, disse:
— Não posso...
— Bem me queria parecer – disse o príncipe sem
troçar do sino pois era muito amigo de tudo e de todos e, além disso, o facto
de um sino ter olhos, nariz e boca já era muito. No entanto, como estava a
gostar de conversar com o sino, continuou:
— E porquê?
— Perdi o meu badalo – respondeu o sino começando
a soluçar.
O pequeno príncipe olhou para o interior do sino. —
Lá isso era verdade! Faltava-lhe a bolinha que todos os sinos têm.
— Ora, não chore, Senhor Sino! Eu hei de encontrar
uma solução. Eu... eu tenho uma bola que serviria muito bem de badalo, uma bola
de oiro maciço.
O sino parou de chorar e abriu os enormes olhos.
— Mostra! Mostra! – pediu logo.
O principezinho estendeu os braços e a bola de
oiro amarelo luziu nas suas mãos.
— Não te importas de ma dar? De verdade que ma
dás? – perguntou o sino numa torrente de palavras, olhando-o com os olhos
radiantes, que, a princípio, pareciam ter saído das órbitas.
— Claro! – foi a resposta do príncipe. – Só não
sei como prendê-la ao ferro do antigo badalo.
— Lembra-te que sou mágico. Encosta a tua bola a
esse ferro e ela ficará presa.
O príncipe assim fez.
— Que bom! Ficou mesmo! – exclamou ele, sentido
ter encontrado um novo e fantástico amigo.
— Fico-te eternamente agradecido. – disse o sino. –
E, como prova do meu reconhecimento, tocarei sempre que quiseres.
E começou a tocar para grande surpresa do príncipe
que nem queria acreditar.
O sino tocava muito bem, mas também muito alto,
ouvindo-se em todo o palácio real.
O rei, a rainha, as aias, os criados vieram todos verificar
o ocorrido, maravilhados. Há tanto tempo que o sino deixara de tocar!
O rei então mandou os jardineiros cuidarem daquela
parte do jardim e, sempre que o principezinho podia ir para o campanário, ele
ia conversar com o sino e ouvi-lo tocar.
FIM
Conto publicado na revista Girassol, n.º 45, abril 1983, pp. 12 e 10.